O Simples Nacional surgiu como uma promessa de simplificação tributária para micro e pequenas empresas, reunindo diversos impostos em um único pagamento mensal e trazendo a expectativa de menos burocracia e facilidade no cumprimento das obrigações fiscais. No entanto, essa simplificação tem um lado pouco comentado, mas que vem ganhando força: a intensificação da malha fina para empresas optantes pelo Simples Nacional.
Para os contadores, entender essa transformação é fundamental. A Receita Federal aprimorou consideravelmente suas ferramentas de fiscalização, ampliando o cruzamento de dados entre declarações, notas fiscais, movimentações bancárias e informações de cartão de crédito, tudo isso de forma automatizada e em tempo real. Isso faz com que o controle e a precisão na apuração das receitas e tributos sejam ainda mais exigidos, mesmo para as pequenas empresas.
Além disso, a legislação tributária e o ambiente fiscal estão em constante mudança, o que exige do contador atualização constante e uma postura proativa para evitar surpresas desagradáveis que podem comprometer a segurança jurídica e financeira dos clientes.
Neste cenário, a malha fina do Simples Nacional representa um desafio crescente que, se não for tratado com atenção e estratégia, pode gerar autuações, multas e até exclusões do regime, impactando diretamente a reputação e a confiança do escritório contábil.
Neste artigo, vamos aprofundar o que está por trás da malha fina do Simples Nacional, como ela funciona na prática, os principais cruzamentos de dados realizados pela Receita Federal, os erros mais comuns que levam à malha, e como o contador pode atuar para proteger seus clientes e também o seu próprio trabalho.
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Como funciona a malha fina do Simples Nacional na prática?
Diferentemente da malha fina do Imposto de Renda Pessoa Física, que é amplamente divulgada e permite que o contribuinte realize retificações antes de qualquer cobrança, a malha do Simples Nacional é silenciosa, automatizada e com consequências rápidas e muitas vezes difíceis de reverter. O sistema da Receita Federal realiza comparações e cruzamentos em tempo real, buscando identificar inconsistências entre as informações declaradas e os dados reais.
Quando divergências são encontradas e não são corrigidas em tempo hábil, o resultado pode ser:
- Notificações de Autorregularização, solicitando ajustes e complementações;
- Termos de Exclusão do Simples Nacional com efeito retroativo, retirando o benefício do regime para períodos passados;
- Cobranças de diferenças de tributos com multa de ofício que pode chegar a 75% do valor devido.
Essa dinâmica torna o trabalho do contador mais desafiador, exigindo monitoramento constante e atuação preventiva para evitar que os clientes sejam surpreendidos com autuações que podem comprometer sua saúde financeira.
O que está sendo cruzado pela Receita Federal?
A Receita Federal ampliou o uso de tecnologia e inteligência para integrar diversas bases de dados, permitindo um monitoramento mais rigoroso e detalhado das operações das empresas no Simples Nacional. Para o contador, é crucial conhecer esses cruzamentos para orientar corretamente seus clientes e prevenir autuações. Os principais pontos de cruzamento são:
- PGDAS-D x Nota Fiscal Eletrônica (NF-e e NFS-e):
Caso a empresa emita notas fiscais fora do sistema contábil oficial ou não comunique corretamente os valores ao contador, o cálculo do DAS será incorreto, gerando divergências que serão detectadas no momento da transmissão das informações. - Receita declarada x movimentação bancária (e-Financeira):
Os bancos informam mensalmente à Receita Federal todas as movimentações financeiras dos clientes que movimentam a partir de R$ 2 mil por mês (pessoa física) ou R$ 6 mil por mês (pessoa jurídica).
Se a movimentação bancária da empresa for muito maior do que o faturamento declarado no Simples Nacional, a Receita pode interpretar como omissão de receita, abrindo margem para autuações silenciosas via cruzamento de dados. - Dados de cartões x receita no DAS:
A Receita Federal tem acesso direto aos dados das operadoras de cartão de crédito e débito. Caso a empresa não repasse todas as vendas feitas por esses meios ao contador, o valor declarado no PGDAS-D será subestimado, gerando inconsistências. - Sublimite estadual x recolhimento de ICMS/ISS:
Empresas que faturam acima de R$ 3,6 milhões ao ano devem recolher ICMS e ISS separadamente, fora do DAS. Caso isso não seja feito, mesmo que o faturamento total esteja dentro do limite de R$ 4,8 milhões, a empresa estará sujeita a autuações. - EFD-Reinf e DCTFWeb:
A falta de declaração correta do INSS retido de terceiros pode causar conflitos de informação com os dados enviados por tomadores ou prestadores de serviços, gerando riscos de fiscalização.
Erros mais comuns que levam à malha fina e como evitá-los
Para o contador, a atuação preventiva é essencial para minimizar riscos. É importante atuar como auditor interno do cliente, identificando e corrigindo inconsistências antes que elas se tornem problemas maiores. Entre os erros mais frequentes estão:
- Empresa emite nota fiscal, mas não informa ao contador:
A solução passa pelo estabelecimento de processos claros para o envio imediato das notas fiscais ou pela adoção de sistemas que integrem automaticamente essas informações, garantindo atualização constante. - Faturamento elevado via Pix ou cartão, mas sem registro no sistema contábil:
É fundamental realizar a conferência mensal dos extratos bancários e dos comprovantes das maquininhas para assegurar que todas as vendas estejam contabilizadas corretamente. - Empresa ultrapassa o limite de R$ 3,6 milhões e continua recolhendo tudo no DAS:
Acompanhar o faturamento acumulado mês a mês e revisar o enquadramento tributário evita cobranças indevidas e autuações. - Incoerência entre folha de pagamento e PGDAS-D:
Verificar se o pró-labore e a folha estão compatíveis com o faturamento é importante para evitar suspeitas de omissão de remuneração, que podem gerar autuações trabalhistas e fiscais.
Como o contador pode se proteger e proteger o cliente
A atuação preventiva e estratégica do contador se apoia em três pilares fundamentais:
- Processos bem definidos com o cliente:
Estabelecer a exigência clara e formal do envio padronizado de documentos, notas fiscais, extratos bancários e comprovantes de venda. É importante formalizar esses processos no contrato de prestação de serviços e treinar os clientes para que compreendam sua importância. - Auditorias periódicas:
Reservar um dia do mês para revisar, de forma detalhada, as empresas optantes pelo Simples Nacional, realizando a comparação entre receita declarada, notas fiscais emitidas e movimentações financeiras para identificar inconsistências e riscos. - Documentação de alertas:
Ao identificar potenciais riscos, envie orientações formais por e-mail para o cliente, registrando os alertas e prevenindo eventuais questionamentos futuros. Essa prática reforça a postura profissional e pode proteger juridicamente o contador.
CONCLUSÃO : Quem espera a receita avisar, já está atrasado
A malha fina do Simples Nacional representa uma nova etapa da fiscalização tributária brasileira: silenciosa, automática e com impactos severos. Para os contadores, isso exige uma mudança de postura, que deve ser mais estratégica, analítica e proativa. Não basta apenas emitir o DAS; é indispensável auditar, orientar o cliente e atuar preventivamente para minimizar riscos.
Os contadores que assumem essa responsabilidade não apenas evitam autuações e prejuízos para seus clientes, mas também se destacam no mercado ao demonstrar domínio técnico e oferecer um serviço de maior valor agregado. Em um contexto onde a fiscalização digital avança rapidamente, a confiança construída por meio da qualidade e da segurança no serviço contábil é o maior diferencial competitivo.
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